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sexta-feira, 26 de novembro de 2010

O dizer do Psicanalista

O dizer do psicanalista, sustenta Nasio, não carrega consigo o propósito de decifrar o inconsciente, mas de produzi-lo sob a forma de acontecimento, relançando a cadeia dos significantes e favorecendo que outros acontecimentos se realizem.
A melhor interpretação se diz sempre em duas ou três palavras bem curtas, à maneira de uma réplica que toca, corta e pontua o enunciado do analisando.
Winnicott foi um reformador liberal da assim chamada técnica psicanalítica clássica e desconstruirá o estilo interpretativo conduzindo-o ao extremo da simplicidade e da discrição, dando-lhe aos poucos a forma de um dito espirituoso, de uma piada, de uma interjeição ou, como preferia dizer, de um rabisco(squiggle).
O espaço transicional, o entre-dois onde coabitam ilusão e verdade, adquirirá uma importância decisiva na eficácia clínica no tratamento psicanalítico. Em 1971 Winnicott afirma que a psicanálise acontece na sobreposição das zonas de brinquedo do paciente e do analista. Analista e paciente brincam no interior do campo transicional quando conseguem conjuntamente cria-lo e usá-lo.
A ilusão do paciente deverá ser necessáriamente aceito, creditada e compartilhada ficcionalmente pelo analista; esta é uma condição sine qua non que o analisando lhe impõe para deixa-lo participar da sua intimidade subjetiva e nestas condições dar-se-a o diálogo transicional.

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

A Horda Selvagem(Recorte do Livro "A família em desordem" de Elisabeth Roudinesco

Em uma época primitiva, conta Freud adotando o estilo de Darwin, os homens viveram no seio de pequenas hordas, todas submissas ao poder despótico de um macho que se apropriava das fêmeas. Certo dia, os filhos da tribo, numa rebelião contra o pai, puseram fim ao reinado da horda selvagem. Num ato de violência coletiva, depois do assassinato, sentiram-se arrependidos, renegaram seu crime e inventaram uma nova ordem social ao instaurarem simultaneamente a exogamia, o interdito do incesto e o totemismo. Foi este o alicerce lendário comum a todas as religiões, e sobretudo do moneteísmo.
Nessa perspectiva, o complexo de Édipo, segundo Freud, não é senão a expressão dos dois desejos recalcados - desejo de incesto, desejo de matar o pai contidos nos dois tabus próprios do totemismo: interdito do incesto, interdito de matar o pai-totem. O complexo é portanto universal, uma vez que é a tradução psíquica dos dois grandes interditos fundadores da sociedade humana.
Mais além do complexo, Freud propõe, como totem e tabu, uma teoria do poder centrada em três imperativos: necessidade de um ato fundador(o crime), necessidade da lei(a punição), necessidade da renúncia ao despotismo da tirania patriárquica encarnada pelo pai da horda selvagem.
O homem freudiano para ser civilizado e satisfazer a mulher, deve controlar a sexualidade selvagem que herdou do pai da horda, e rejeitar a poligamia, o incesto, o estupro. Deve aceitar o declínio de seu antigo poder.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

TRAUMA

Ferenczi nos ensina  que o trauma acontece quando a linguagem da paixão, usada por um adulto enlouquecido de fúria ou sexualidade, em quem a criança confia, violenta a linguagem da ternura, do amor e da confiança que a criança deposita naquele seu cuidador. A criança busca então um segundo adulto para relatar o maltrato acontecido, e é nessa hora que o trauma se concretiza, pois esse segundo adulto mesmo sabendo que a criança está dizendo a verdade, a confunde afirmando que não aconteceu nada, que ela entendeu mal. A criança fica então sem ter em quem confiar, nem nela mesma, pois sua percepção também foi atacada.
A criança necessita de alguém em quem possa contar a sua dor, ser ouvido e verdadeiramente compreendido.

Os pacientes de hoje apresentam-se bem mais desorganizados psiquicamente que os neuróticos de antigamente. Nossos pacientes são traumatizados pelas inúmeras e variadas formas de desamparo e abandono que a sociedade atual vem impondo.
A relação real com a pessoa do analista é que fornece um ambiente facilitador e acolhedor para que o frágil ego infantil dentro da pessoa do paciente possa florescer.
No restrito ambiente do setting, cabe ao analista adaptar-se ao paciente, levando em conta que tanto o ambiente como o setting psicanalítico pode ser facilitador da estruturação do psiquismo ou atuar como desorganizador da mesma.
Segundo Ferenczi:
Trauma: Fruto de conflitos reais com o mundo externo.
Trauma sexual: Protótipo da violência contra um ego imaturo.

Violência Moral: Rigor inadequado da educação como acionadores da "Confusão de línguas entre adultos e crianças".
A violência fica adscrita à pulsão, a violência é o exercício da força para subjugar a outro e, inclusive, matá-lo. As armas substituem a força muscular e a morte do inimigo satisfaz uma inclinação pulsional. A violência é quebrantada pela união sempre em termos pulsionais, e o direito é o poder de uma comunidade.
A violência de um indivíduo e a violência de uma comunidade, sendo que uma comunidade pode se proteger da violência estabelecendo laços especiais.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

A Justiça Falha por Tardar!!!

A Justiça Falha por Tardar


Rodrigo Angélico Pacheco, advogado.

Quem já não ouviu esse jargão 'A Justiça tarda mas não falha'? Se formos pensar melhor, isso é uma grande inversão. A justiça falha justamente por tardar. O que adianta o alívio ou a recompensa na justiça, quando o dano se tornou irreparável pelo tempo? A verdade é que a sociedade como um todo está infelizmente montada numa estrutura invertida e patológica e o Direito não é nenhuma exceção.



De maneira que precisamos todos, operadores do Direito: advogados, juízes, procuradores, promotores, etc., ter em mente alguns pontos fundamentais sobre a ciência da psico-sóciopatologia, desenvolvida por Norberto Keppe, para produzirmos uma justiça de qualidade.



Estou convencido de que, quando se aplica uma norma ao fato em concreto, se não tivermos conhecimento dos aspectos básicos da patologia, tais como a megalomania, inversão, intolerância, e a paranóia, ao invés de aplicar sabedoria, buscar a verdade, ou justiça, estaremos fazendo do processo um meio de "identificação projetiva", ou seja, estaremos projetando nas circunstâncias processuais os nossos problemas inconscientes. Em outras palavras, é trazer para dentro do processo, além dos fatos, todo o universo interior patológico das emoções que contaminam e deturpam a verdade.



Em minha militância como advogado, percebo claramente que algumas vezes o processo é, de um lado, o trabalho do advogado em atender os interesses de seu cliente (será que todos esses interesses são sempre de fato legítimos?) e, de outro lado, o do juiz, que muitas vezes demonstra claramente seu desinteresse pelo processo. Esse desinteresse demonstra, não raro, a resistência psicológica por parte de juízes em lidar com o reflexo de suas problemáticas internas dentro do processo.



A seguir transcrevo um relato de uma colega de trabalho, Dra Flávia, que ilustra com clareza um aspecto patológico, nesse caso, dos juízes:



“A lei prevê a igualdade entre juízes e advogados, bem como o direito destes últimos serem recebidos por aqueles. Entretanto, tenho percebido que nos últimos anos é enorme a dificuldade de acesso à maioria dos gabinetes dos juízes de Primeira Instância, para despachar petições ou mesmo expor algum fato novo que precisa de maior atenção.”



Não é difícil o leitor perceber que a atitude de alguns juízes, é de se isolar, confundindo claramente sua pessoa com o cargo que ocupam. Acredito que o narcisismo de alguns indivíduos, ou seja, viver voltado às suas próprias ideias, em vez de se concentrar no mundo externo e real, torna ainda mais difícil a tarefa.



“Não existe nada mais antiético do que permitir que as emoções vaguem à solta, pois se trata da substituição da realidade pelo mundo alienado dos sentimentos ruins.” (A Libertação da Vontade pag 120. Norberto Keppe - Editora Proton).



Tudo que fazemos espelha aquilo que somos, pensamos e sentimos, por isso, a necessidade, de uma psique equilibrada, para que o processo como um todo cumpra a sua função de justiça.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Nossos direitos devem ser respeitados!!!

Achei o artigo muito interessante!!!


Nossos direitos devem ser respeitados: quais e como?


Por Amália Negrão Leite Ribeiro* Irma Pereira Maceira **

Mãe, ele pegou meu brinquedo! Professora, pegaram a minha borracha! Pensava que era meu amigo, mas está de olho na minha namorada. Não aguento mais meu chefe! Trabalho, trabalho e não saio da mesma estaca! Assim não dá! Puxaram o meu tapete. Estão me pressionando para sair, mas vão ver: vou exigir meus direitos...



Desde a infância, convivemos com a disputa, desentendimentos, insatisfações. A cada geração, parece que os problemas não só se repetem, como vão se tornando mais diversificados e maiores. Sentimo-nos envolvidos em situações insuportáveis, geralmente culpando alguém por tudo que não alcançamos: os irmãos, os pais, os colegas, os chefes, governantes corruptos. Mais recentemente, até a globalização! Nossos direitos não são respeitados e sentimo-nos “vítimas do sistema”.



Diante do que entendemos como injustiças, sentindo-nos impotentes: ora entramos em depressão, ora nos revoltamos, agredimos, destruímos até. Adoecemos. A sociedade adoece. Insatisfação, insegurança, revolta, desesperança é o que resta. Mas não é bem assim. Ou melhor, não fomos criados para que seja assim.



Há cerca de sessenta anos, Norberto Keppe dedica sua vida ao estudo dos problemas que “atormentam” o ser humano. Em seu livro “A Libertação da Vontade” afirma: O ser humano adoece ao negar, omitir ou deturpar a realidade; neste último, estou esclarecendo a conduta de rejeitar, anular e denegrir a virtude, o bem, a verdade e a beleza. O problema central da humanidade é sem dúvida alguma o moral, que ocasionou todas as perturbações sociais e individuais.



É comum ouvirmos: “Falar é fácil...!” E seguimos vivendo da mesma forma, suportando os mesmos problemas, sofrendo e responsabilizando ou outros por tudo que não alcançamos. Mas é possível, sim, mudar esta situação. Como? Procurando tomar consciência do que realmente queremos, qual a forma eficaz para alcançarmos nossos objetivos, informando-nos (já que não convém, aos que estão no poder, oferecer a todos os ensinamentos necessários e devidos) da consequências de cada um de nossos atos.



Num primeiro momento, ao tomarmos qualquer atitude, devemos partir de um raciocínio muito simples e do qual todos temos conhecimento: se fizessem isso para mim, eu acharia justo? Se a resposta for “não”, não tomemos esta atitude. Infelizmente, nem sempre é o que acontece. Daí os conflitos, a desarmonia. Então, devemos dar um passo à frente – procurar entender o que é Direito.



A palavra direito vem do latim directum ou rectum: direito ou reto. Conforme interpreta o professor Machado Neto, da Universidade da Bahia, “o Direito é conduta e não norma. Conduta adotada no relacionamento entre sujeitos”.



Na Roma Antiga, Justiniano já afirmava que “não é da regra que o emana o direito, mas do direito (jus) é que se faz a regra”. O termo latino jus significa conforme a justiça e também mandar, ordenar. Em Roma, nas Assembléias, os cidadãos discutiam as regras e concordavam em ordená-las. No idioma falado por povos da Itália, Pérsia e Índia, jaus ou jous exprimia uma idéia correspondente às noções mais elevadas que o espírito do homem possa conceber. E, no idioma dos vedas, yós significava bom, santo, divino.



Empregada no sentido de norma ou lei, a palavra direito significa que a lei deve estabelecer o que é justo e determinar seu reconhecimento – o que nem sempre é realidade. Cláudia Pacheco, no livro “ABC da Psicanálise Integral – Trilogia Analítica”, analisando como solucionar os conflitos surgidos na convivência social, afirma que a correção virá por meio de leis justas para todos. Keppe percebeu que por trás das estruturas sociais, políticas e econômicas, de todas as leis, que o povo tanto respeita e admira existe uma grande doença repleta de más intenções, inveja, desejo de poder, exploração e manipulação. Será necessário que os indivíduos mais conscientes reavaliem essas regras sociais, selecionando o que realmente tem valor e é saudável.



Se há governantes e legisladores, é porque o voto de cada um de nós os colocou no poder. É preciso que tomemos consciência da força do voto, procurando saber quais são as funções dos vereadores, dos deputados, dos senadores para, então, podermos avaliar quais candidatos apresentam as qualificações exigidas para exercer suas funções dignamente, em nosso nome – aqueles que merecem nosso voto. Se trocarmos o poder de nosso voto por promessas ilusórias, brindes ou vantagens pessoais, seremos partícipes dos desvios de conduta que vierem a ser praticados por nossos representantes.



Direito pode significar, também, ciência normativa humana, moral, tendo por finalidade ordenar a conduta social dos homens, no sentido da justiça. Conduta moral é comportamento honesto. Assim, o Direito está estreitamente ligado à Ética, ou seja, determinar como agir - seu objeto deve ser a ordenação do comportamento humano voltado para o bem, pessoal e comum.



E o que é o bem? Keppe, no livro “O Reino do Homem”, adotando a orientação dos filósofos estóicos, reconhece que somente pela prática das virtudes é que o ser humano chegaria ao bem – único caminho da riqueza, bem-estar e felicidade humana. A virtude é o caminho da verdade; um homem virtuoso é ao mesmo tempo um homem de ação, pois a virtude é um saber e ensino. A virtude tem de ser vista como o maior ideal de realização para que o indivíduo e a sociedade sejam equilibrados e se desenvolvam.

E conclui: Posso afirmar que o maior problema do homem é sua falta de ética, que o leva a todas as doenças e males humanos e sociais.



Logo, o que pode parecer impossível, um sonho é, felizmente, uma realidade. Ainda que a qualquer momento, em qualquer idade, seja possível retomar condutas capazes de trazer de volta a tão ansiada dignidade, afastando as angústias e frustrações, ao se aproximar a comemoração da vinda do Jesus Menino, cada um de nós tem uma motivação a mais para que este momento de conscientização, de interiorização seja hoje, agora.



Fernando Pessoa, poeta português, já ponderava: “Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma de nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e se não ousarmos fazê-la teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos”.



Como ensina Keppe, no livro “Contemplação e Ação”, de há muito, acostumamo-nos a ouvir que a maior das revoluções, em toda a História da Humanidade, foi realizada por Jesus Cristo. No entanto, o essencial, do que falou, ainda não foi compreendido e posto em prática. Ele não considerou o dinheiro, o sexo e as honras sociais, como os elementos mais importantes da vida; pelo contrário, viu na humildade, na modéstia, no pacifismo e, principalmente, no amor ao próximo (e a Deus, evidentemente), os fatores primordiais para bem viver.



Tudo o que fazemos espelha aquilo que somos, pensamos e sentimos, por isso, a necessidade de uma psique equilibrada. Conhecendo-nos melhor seremos capazes de conviver com os problemas e adotar condutas tais que superem os conflitos de interesses e construam o verdadeiro bem estar social, uma vida de paz e harmonia.




*Advogada. Formada em Música, História, Geografia e Mediação

e Arbitragem.



** Advogada, doutoranda em Direito Comparado,

Professora da UNIP.



Artigo publicado no jornal 'Estado de Direito' de Porto Alegre

Edição de Novembro e Dezembro de 2009 • ANO IV • N° 23

Site do jornal: www.estadodedireito.com.br

terça-feira, 17 de agosto de 2010

As crianças "não" são o melhor do mundo

Uma postagem de Jotabê(Sul de Portugal) da qual achei muito interessante, principalmente para refletirmos das crianças na sociedade em que vivemos com uma cultura e economia hostil.
Tenho, ou melhor tinha, pois estou aqui a partilhar com vocês, um segredo de opinião que me vinha, tal qual todos os outros que ainda irão permanecer, a corroer.



Odeio a expressão, “As crianças são o melhor do mundo”.

E odeio tão-somente por estes dois motivos; primeiro por não concordar com ela, o que só por si é relevante, e segundo porque no meu íntimo, ao não concordar, achava que não devia partilhar esta opinião com mais ninguém, não fossem ficar a gostar menos de mim, (eu sempre tive um grande défice de afectos).



É uma expressão que sempre que a oiço, dá-me comichão, na garganta, (talvez por ter que calar o desacordo), na nuca, nas costas, e não são assim tão raras as vezes que me provoca oma tosse compulsiva, acabo sempre por disfarçar com um engasgue inventado.



Para não chatear com fastidiosas explicações, esta expressão, na minha opinião, é como um imaculado manifesto que nos remete a todos nós, os adultos, para a condição de maus seres. Pois bem, basta andar atento e olhar em redor para facilmente chegar à conclusão que, as crianças podem ser, ofensivas, desgradáveis e impossiveis de aturar, perversas, chantageadoras, podem até matar. As razões para tal não interessam, podem ser as mais variadas, o que interessa é que as crianças serão sempre reflexo do ambiente que as rodeia, e os pais terão quase sempre o papel decisivo nesse processo, sei também que para muitos isto é chinês. Na sua ausência, responsáveis, tutores, ou mesmo instituições, representarão esse papel, é este o resto do quase que atrás referi.



E tudo isto permanecia amordaçado cá dentro de mim.

Eis quando surge então uma opinião vinda de Eduardo Sá.



Quem é Eduardo Sá?

Eduardo Sá é psicólogo clínico, psicanalista e professor de psicologia clínica na Universidade de Coimbra e no Instituto Superior de Psicologia Aplicada, em Lisboa. Tem uma longa experiência de acompanhamento de fetos e de bebés, de crianças, de adolescentes e das suas famílias. Director da Clínica Bebés & Crescidos.Tem colaborado regularmente na imprensa, nomeadamente nas revistas XIS, do jornal Público, Adolescentes, e actualmente na Notícias Magazine, do Diário de Notícias, publicou, Manual de Instruções para uma família feliz, Más maneiras de sermos bons pais, Psicologia dos pais e do brincar, A maternidade e o bebé, A vida não se aprende nos livros, Tudo o que o amor não é, Chega-te a mim e deixa-te estar, Crianças para sempre e, em co-autoria, O melhor do mundo.

(In Oficina do Livro)



E o que disse então Eduardo Sá?

Ora bem, o sr. doutor disse mais ou menos isto:

As crianças não são efectivamente o melhor do mundo. As crianças podem ser muito mazinhas, dependendo de quem e da forma como são educadas. E precisamente por serem pessoas influenciáveis e moldáveis, nunca poderiam ser esses seres melhores, os melhores. Considerar as crianças como seres melhores que qualquer outro, é pressupor que caminhamos ao longo da nossa vida para pessoas cada vez piores, o que na verdade não é bem assim. É importante enquadrá-las e harmonizá-las com a sociedade como seres de direito, respeitá-las, educá-las e amá-las. Na nossa vida tornamo-nos seres cada vez mais capazes, melhoramos profissionalmente e psicologicamente, cultivamo-nos e enriquecemos com a experiência de vida, não o contrário.



Ora aí está, agora com toda a autoridade, “As crianças não são o melhor do mundo”, e congratulo-me com o facto de ficar com menos um segredo cabeludo que me consumia.

domingo, 15 de agosto de 2010

A Vida Psíquica

A VIDA PSÍQUICA – (Texto do Livro “Convite à Filosofia” de Marilena Chauí)







A vida psíquica é constituída de três instâncias:



- isso↔id↔instância inteiramente inconsciente



- Eu ↔ ego ↔ instância consciente



- Super-eu ↔ superego ↔ possui aspectos conscientes e inconscientes





O id é formado por instintos, impulsos orgânicos e desejos inconscientes, pulsões; regida pelo princípio do prazer, exige satisfação imediata. Freud descobriu que os instintos, impulsos e desejos inconscientes, pulsões, são de natureza sexual empregou o termo em latim de : libido(lascívia, luxúria, desejo sexual violento).



O id é o reservatório primitivo da energia psíquica ou o reservatório da libido. A sexualidade não se reduz ao ato sexual genital, mas envolve todos os desejos que pedem satisfação e podem ser satisfeitos em qualquer parte do nosso corpo ou na totalidade dele.

Para escândalo da Sociedade Européia no final do século XIX e início do XX, Freud introduziu a idéia de sexualidade infantil.

As três fases da sexualidade infantil que se diferenciam pelos órgãos que sentem prazer e pelos objetos e seres que dão prazer.



- Fase Oral: Entre os primeiros meses de vida e os 5 ou 6 anos, ligada ao desenvolvimento do id, quando o desejo e o prazer localizam-se primordialmente na boca e na ingestão de alimentos, e o seio materno é o objeto de prazer ( ou seus substitutos, como a mamadeira, a chupeta, os dedos);



- Fase Anal: Quando o desejo e o prazer localizam-se primordialmente nas excreções e nas fezes, e os objetos de prazer são brincar com massas e com tintas, amassar barro ou argila, comer coisas cremosas, sujar-se;



- Fase Fálica: Quando o desejo e o prazer localizam-se primordialmente no órgão genital masculino, o falo ou pênis, pois a criança, menino ou menina, nessa fase só reconhece esse órgão sexual.

Como nota minha(Conedera) arrisco a dizer aqui que para a menina o falo é o órgão genital feminino, a vagina.



É na fase fálica que surge, no centro do ID, determinando toda a vida psíquica, o que Freud denominou de Complexo Nuclear das neuroses ou Complexo de Édipo.

O termo “Complexo” é empregado por Freud para indicar que se trata de um conjunto de várias pulsões nas quais se exprime o mesmo desejo. É esse desejo fundamental que organiza a totalidade da vida psíquica e determina o sentido de nossa vida, pois tudo dependerá como a criança conseguirá ou não superar esse complexo.

É esse complexo que determina também o sentimento da ameaça da castração ou surgimento de outro complexo, conhecido como complexo de castração, no qual a criança teme perder o falo como punição de seu desejo incestuoso.



Para que o sujeito se proteja, o id passa pelo ego que é o intermediador do meio externo, o ego verifica se o meio externo está adequado para satisfazer as pulsões do id, se não estiver o ego se utilizará de mecanismos de defesa evitando a dor psíquica, postergando a satisfação do id. Veja bem a pulsão de um sujeito pode passar a vida inteira sem ser satisfeita atuando sempre em seus mecanismos de defesa, considerado saudável, evitando a neurose.



O ego ou o eu é a consciência, pequena parte da vida psíquica, submetida aos desejos do id e a observação. Obedece ao princípio da realidade, ou seja, à necessidade de encontrar objetos que possam satizfazer os id sem transgredir as exigências do superego.



Num ensaio intitulado “o ego e o id”, Freud escreve que o ego é um “pobre coitado” , espremido entre três escravidões ou por três senhores: os desejos insaciáveis do id, a severidade repressiva do superego e os perigos do mundo exterior. Se se submeter ao id, torna-se imoral e destrutivo; Se se submeter ao superego, enlouquece de desespero, pois viverá numa insatisfação insuportável; se não se submeter à realidade do mundo será destruído por ele.



Cabe ao ego encontrar caminhos para a angústia existencial. Estamos divididos entre o princípio do prazer( que não conhece limites) e o princípio da realidade( que nos impõe limites externos e internos).

Ao ego é dada uma função dupla, ao mesmo tempo recalcar o id, satisfazendo o superego, e satisfazer o id limitando o poderio do superego.

A vida consciente normal é o equilíbrio encontrado pela consciência para realizar sua dupla função. As neuroses indicam a dificuldade da realização desse equilíbrio e as psicoses( ou a loucura) exprimem a incapacidade do ego para realizar sua dupla função, seja porque o id ou o superego são sua dupla função, seja porque o id ou o superego são excessivamente fortes, seja porque o ego é excessivamente fraco.



A manifestação do inconsciente de forma inconsciente em uma dimensão imaginária de nossa vida psíquica; substituições, sonhos, lapsos de linguagem e de memória, atos falhos, prazer e desprazer com objetos e pessoas, medo ou bem estar com objetos ou pessoas indica que os recursos inconscientes para surgir indiretamente à consciência possuem dois níveis.



- Conteúdo manifesto(escada, mar, e incêncio, no sonho; a palavra esquecida e a pronunciada, no lapso; um objeto quebrado no ato falho; afetos contrários por coisas e pessoas)



- Conteúdo Latente: É o conteúdo inconsciente real e oculto( os desejos sexuais)



Nossa vida normal se passa no plano dos conteúdos manifestos e, portanto, no imaginário. Somente por meio de uma análise nos permite decifrar o conteúdo latente que se dissimula sob o conteúdo manifesto.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Mafalda

POEMA DE MARIO QUINTANA

Para refletirmos quanto a preenchermo-nos, alguns dizem em nossa sociedade capitalista em preenchermos com um objeto, consumismo, e não mais do outro, o humano, tudo é muito frio. Mario Quintana falando de Borboletas muito sabiamente fez o seguinte poema:

Quando depositamos muita confiança ou expectativas em uma pessoa, o risco de se decepcionar é grande.
As pessoas não estão neste mundo para satisfazer as nossas expectativas, assim como não estamos aqui, para satisfazer as dela.
Temos que nos bastar...nos bastar sempre e quando procuramos estar com alguém, temos que nos conscientizar de que estamos juntos porque gostamos, porque queremos e nos sentimos bem, nunca por precisar de alguém.
 As pessoas não se precisam, elas se completam... não por serem metades, mas por serem inteiras, dispostas a dividir objetivos comuns, alegrias e vida.
Com o tempo, você vai percebendo que para ser feliz com outra pessoa, você precisa em primeiro lugar, não precisar dela. Percebe também que aquela pessoa que você ama(ou acha que ama) e que não quer nada com você, definitivamente, não é o homem ou a mulher de sua vida.
Você aprende a gostar de você, a cuidar de você, e principalmente a gostar de quem gosta de você.
O segredo é não cuidar das borboletas e sim cuidar do jardim para que elas venham até você.
No final de contas, você vai achar não quem estava procurando, mas quemestava procurando por você!

::Mafalda - Primer Día de Escuela::

Mafalda va a la Escuela

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Disciplinar nossas crianças

A educação de nossas crianças, não digo a educação do aprender a ler e a escrever, cada vez mais é dirigida única e exclusivamente como tarefa da escola, onde os pais preferem esquivar-se a enfrentar a fúria e o mau humor de seus filhos.


Estamos cansados de assistir as crises de birras das crianças que não se contentam com o que lhes é dado. Quantas e quantas vezes vemos nas filas dos supermercados e shoppings, crianças embolando, gritando e agredindo, impondo aos pais o direito de terem e fazerem apenas o que desejam. Estaria nossa sociedade entregue a estes pequenos tiranos?!…


A escola é o ambiente onde a criança passa a maior parte do seu tempo de vida. É o lugar escolhido para brincar, sonhar, estudar, pintar e fazer novos amiguinhos. É na escola onde a criança dar seus primeiros passos rumo ao descobrimento das letras, da escrita e da aprendizagem propriamente dita. É o lugar, por excelência, carregado de magia, de surpresas e descobertas para o desenvolvimento psico-social-acadêmico e afetivo da criança. É o mundo encantado das letras, das amizades e descobertas da vida e para a vida.

Assim sendo, a escola é a o alicerce para o desenvolvimento e crescimento de nossas crianças, atuando na formação de cidadãos conscientes de seu papel, de respeito e obediência aos pais, estando a escola no papel mediador do conhecimento e prática dos bons costumes. E por falar nos bons costumes…Que tal aproveitarmos a oportunidade e tentarmos ajudar nossas crianças a se portarem e serem bons cidadãos e semeadores do bom costume, do bom comportamento, e por que não, do bom filho?!.

A agressividade é característica do comportamento de todo o ser, quer seja criança ou adulto, mas para que esta seja considerada “normal”, digo aceitável, ela tem que ser canalizada para aquisição do crescimento e desenvolvimento de todo ser humano, quando bem canalizada tem o seu papel de grande importância para o ser, isto é, a tentativa e busca de vencer na vida, mas quando não, é considerada uma atitude negativa e desestrutura a criança, a família e parte da sociedade.E pensando assim, vale a pena lembrar a vocês pais o quão é saudável e importante falar sempre a verdade para os filhos, ter atitudes coerentes e firmes e não deixar ser levados pelos caprichos e birras dos mesmos. Devemos amá-los incondicionalmente, mas isto não implica em fazer tudo o que eles desejam e pedem. Amar é educar com amor, prepará-los para a vida, para serem cidadãos educados e compromissados com a ética.

Pense bem antes de tomar uma medida enérgica com seu filho. A conversa é muito importante para o enriquecimento do diálogo entre os membros familiares, como também para o conhecimento da dinâmica familiar.



Lembrem-se: os filhos são o reflexo dos pais!



{Escrito por: Adriana Gaião e Barbosa}

terça-feira, 20 de julho de 2010

Sexualidade Infantil(artigo de Rosana Mafra)

A sexualidade pode ser vista como “a base da curiosidade, a força que nos permite elaborar e ter idéias, bem como o desejo de ser amado e valorizado à medida que aprendemos a amar e a valorizar o outro” (BRITZMAN, 1998, p.162). A sexualidade manifesta-se através de atitudes, comportamentos, gestos, ultrapassa, portanto, a dimensão biológica, pois envolve emoção, afeto e imaginário. A sexualidade se expressa através do corpo, na subjetividade única de cada sujeito. Ela mostra sua dimensão existencial, quando pensada como direito individual, da ordem do íntimo, que envolve o sujeito em sua totalidade. Ela manifesta sua dimensão social, quando as peculiaridades adquiridas emergem da sociedade em que o sujeito está inserido.




No espaço escolar, na sala de aula, por exemplo, há crianças em condições de subordinação em relação aos professores, os quais assumem o papel de transmissores de um conhecimento legitimado. Assim, o corpo do aluno fica submisso a lugares e comportamentos pré-determinados, organizados pela dinâmica escolar. Seriam os “corpos dóceis, corpos submissos”, como enfatiza Foucault (1984, p. 118-119). Este autor destaca que a compreensão do caráter social da sexualidade é definida pelas elaborações histórica, política e contextual, explicadas pelas manifestações sociais e históricas, cujas formas e variações não podem ser identificadas sem que se examine e explique o contexto em que se formaram. A pessoa nasce com seu corpo definido (ser homem ou mulher; ser alto ou baixo, ser loiro ou moreno...), porém a sexualidade é aprendida, construída pelo próprio sujeito e, em grande parte, condicionada por sistemas de valores familiares, culturais e sociais vigentes. Estes valores são, muitas vezes, reforçados, reprimidos e normatizados por influências religiosas e morais e pelo que é divulgado por livros e histórias infantis, os quais submetem a criança a determinados modelos ideológicos que influem sobre sua expressão.



A sexualidade tem sido também descrita, compreendida, explicada, regulada, estudada, normatizada a partir de várias perspectivas e campos disciplinares repressor. O educador é de igual forma, fruto dessa educação repressora. Ela também marcou o caminho por ele percorrido. O educador, portanto, traz implícitas, em suas ações, as concepções de sua educação sexual e de sua vida pessoal. O educador é um sujeito sócio-cultural, um ator social de grande destaque no espaço escolar e desempenha papel crucial, principalmente no que diz respeito às interfaces corpo, gênero e sexualidade na educação. A escola, sendo um espaço educativo, desempenha papel determinante na formação da criança, com vista a seu posicionamento e sua integração em uma sociedade em constante mudança, que se torna constantemente mais complexa, exigente e desigual.



Refletir sobre gênero, corpo e sexualidade, numa época de transição de valores como a atual, é bastante complexo. Pode-se encontrar na mesma escola pessoas com argumentações totalmente diferentes sobre assuntos ligados à manifestação da sexualidade. Abordar o tema emergente da sexualidade constitui grande desafio aos educadores.



Estes temas vêm sendo divulgado abertamente pelos meios de comunicação, através de propagandas, outdoor, programas infantis, programas de auditório, filmes, novelas, revistas masculinas e femininas. É só acessar a televisão ou a Internet e, rapidamente, as crianças recebem os mais variados estímulos direcionadas a estas questões.



Não se pode negar, no entanto, que as crianças, embora recebam enorme quantidade de informações principalmente sobre o sexo, ainda apresentam uma compreensão equivocada sobre o assunto, porque muito pouco é explicado, discutido. As cenas, imagens, propagandas que estão postas encarregam-se de tornar tudo muito explícito para a criança, porém sem oportunizar-lhes o conhecimento necessário. Pais e professores têm dúvidas sobre como agir, pois acreditam que, debatendo o assunto, podem influenciar a criança ou despertar curiosidades inoportunas. Um considerável grupo de educadores ainda acredita que a educação sexual, na escola, deve restringir-se a informações sobre fisiologia, anatomia, aparelho de reprodução e por isto ser de responsabilidade dos professores de Biologia.



As crianças convivem quotidianamente com cenas de sexo, seja em casa, seja na rua. Elas são motivadas à erotização precoce, através da imitação de comportamentos sugeridos por músicas e coreografias, que estimulam a sexualidade e a sensualidade.



As crianças querem saber sobre as diferenças existentes entre si e os papéis que desempenham. Desejam encontrar, na escola e na família, o lugar em que, contemplados pelo afetivo, envolvidos pelo acolhimento de seus sentimentos e emoções, tenham respostas para suas perguntas, onde assuntos referentes a gênero e sexualidade sejam adequadamente tratados.



É fundamental que a abordagem da temática corpo, gênero e sexualidade seja feita de forma prazerosa e constitua projeto permanente no espaço escolar.







Fonte:

BRITZMAN, Deborah. Sexualidade e cidadania democrática. IN: SILVA, Luiz Heron. A escola cidadã no contexto da globalização. Petrópolis, Vozes, 1998.



FOUCAULT, M. . História da Sexualidade I: A vontade de saber. Tradução de Maria Thereza da Costa Albuquerque e J.A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro : Graal, 1984.



NUNES, César: Desvendando a sexualidade . Campinas: Papirus,1997.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

A Sociedade Contemporânea

Pontuações de um artigo de ¹Sérgio Lewkowicz(membro efetivo e Analista Didata da SPPA) nos traz contribuições reflexivas para a sociedade atual; Como:
-¹ Aprendemos com a Psicanálise que tanto para o desenvolvimento individual como para o desenvolvimento da civilização, um dos fatores decisivos é a capacidade de sacrificar interesses, desejos e necessidades individuais, abrindo assim espaço dentro de nós para a aceitação dos outros, com seus interesses, desejos e necessidades.

 Esta aceitação do outro quando acolhida com amor(sublime) tem a capacidade de se criar uma sociedade saudável, humana, com valores e virtudes. Este amor pode ser chamado de transferência positiva que quando ocorre em um setting analítico a análise se aprofunda e evolui.

- ¹Esse sacrifício individual não é nada fácil e só se torna possível quando os cuidadores de uma pessoa, desde a sua tenra infância  lhe ajudam a criar um espaço psíquico que permita substituir parte dessa perda, desse sacrifício por um ganho simbólico, como o sonho e o brincar que são exemplos dessa aquisição de uma alma. Desenvolve-se assim a capacidade de pensar e de perceber mais adequadamente a realidade. Por outro lado quando esse desenvolvimento não ocorre, se evolui para uma situação de desrespeito e desconsideração com o outro, um estado narcísico, tão frequante nos dias de hoje.
A morte do simbólico equivale à morte do outro, levando a uma situação em que se pode matar, estuprar, roubar e humilhar sem maiores considerações e consequências.

Nota-se o quão é importante é a infância, o brincar, sonhar para a construção de um sujeito saudável e consequentemente um coletivo saudável.
Quando o sujeito em idade adulta se depara com uma infinidade de ofertas, de visões de mundo e estilos de vida, mas não sabe como escolher, muitas vezes com escolhas de um desrespeito a si mesmo e uma tentativa de ser amado e reconhecido porém em um grupo social de valores invertidos.
A tentativa de ser amado e reconhecido em nossa singularidade esbarra na dificuldade de encontrar o nosso lugar no mundo.
Não dispondo de um lugar garantido, a única alternativa é tentar fazer-se reconhecer, no jogo dinâmico das relações sociais, como portador de atributos de valor sancionados pelo grupo social de que se faz parte. Os vários outros com quem nos deparamos são tomados como espelho e constituem a mediação necessária para a produção de inserções sociais minimamente estáveis e satisfatórias, possem a se constituir em fontes de sofrimento psíquico que, muitas vezes, recebem o nome genérico de depressão. Uma formação imaginária do inconsciente gera conflitos inconscientes ocasionando dificuldades de relações sociais.
A dor psíquica pode muitas vezes ser maior que a capacidade de relação do sujeito, prevalecem os sentimentos de impotência e uma passividade queixosa e improdutiva.
O enorme vazio deixado internamente exige algum tipo de preenchimento. A carência da alma tenta ser suprida por outros objetos daí o surgimento da clínica do vazio.
O interesse individual ou de um grupo predomina sobre todos os outros, não importando os meios para se conseguir os objetivos desejados, ficando eles mesmos dominados pelos seus próprios aspectos destrutivos e narcisistas funcionando como um boomerang.
A análise é muito importante para o ser humano tentar sair desse looping.

domingo, 13 de junho de 2010

O MITO DE PSIQUÊ

Conta que Psiquê era a mais jovem e mais bela das três filhas de um rei. Todos os súditos corriam à sua volta para admirá-la e prestarem-lhe um mesmo culto esquecendo-se das marcas de devoção que eram devidas a Vênus, a Deusa do Amor. Vênus concebeu, então uma vingança de ciúmes e chamou o seu filho para que a ajudasse, pedindo-lhe para inspirar em Psiquê o amor pelo mais feio e mais desprezível dos homens. Cupido esticou o seu arco e voou em direção a jovem. Mas, logo que a viu ficou de tal modo encantado pela sua beleza que se apaixonou por ela e não executou as ordens da sua divina mãe.
Enquanto que as duas irmãs de Psiquê esposavam ricos personagens, a bela jovem não se decidia por nenhum pretendente. Muito preocupado, o rei, seu pai, consultou o oráculo de Apolo, que lhe ordenou vestir a sua filha de negro e a acompanhar até ao cimo de uma colina onde uma serpente horrenda viria unir-se a ela. Apesar do seu desespero, o rei executou as ordens dos deuses e abandonou Psiquê. Então, levantou-se uma brisa suave e o sopro de zefiro transportou a jovem nos ares para a pousar sã e salva num macio e fragrante prado onde ela adormeceu. No dia seguinte, mal abriu os olhos viu que se encontrava no jardim encantado de um palácio de ouro e prata incrustado de pedras preciosas. Ela aproximou-se, inquieta e curiosa, da habitação desconhecida e ouviu o som de uma voz que a convidava a penetrar na rica mansão; empurrou a porta e viu, em salas luxuosas, já preparados um banho, uma ceia e um leito suntuoso onde se deitou após o crepúsculo. Pouco depois, deu-se conta de uma presença a seu lado e pensou que fosse o marido de que tinha falado o oráculo. Este esposo apaixonado e terno pediu a Psiquê que o não olhasse. A jovem, aliás, obteve a autorização para voltar a casa por uns dias e rever os seus familiares. Mas as suas irmãs, ao vê-la assim tão feliz, tentaram criar a dúvida no seu coração e declararam-lhe que, nas trevas da noite, certamente que era a um monstro a quem ela se unia. Perturbada, Psiquê, no dia do seu regresso, ao cair da noite, quando se aproximou do seu marido que dormia, iluminou-o com a sua lâmpada. Em vez de um montro, ela distinguiu cupido, o mais belo e mais amável dos deuses. Fascinada, aproximou a lâmpada ainda mais perto e uma gota de azeite a ferver caiu, então, no ombro do seu Divino Esposo. Este despertou em sobressalto, censurou Psiquê pela sua desconfiança e desapareceu. Louca de dor, a infortunada errou à sua procura e, por fim, desesperada, dirigiu-se a vênus. A Deusa, muito feliz por se poder vingar, reteve psiquê ao seu serviço como escrava e impôs-lhe trabalhos rudes e humilhantes. Mas nenhuma tarefa parecia impossível à jovem, tanto era a coragem e perseverança que lhe dava o seu amor.
Com a ajuda das formigas, ela separou as espécies de grãos que vênus tinha misturado. Trouxe a lã de ouro de ferozes carneiros graças à ajuda de uma águia; pôde tirar a água da fonte do styx, considerada inacessível; adulou cerebro e chegou até ao trono de prosperina no mais profundo dos infernos para trazer a vênus um pouco da beleza da rainha das Sombras. No entanto, a sua curiosidade iria perdê-la uma segunda vez. Abriu uma caixa que lhe havia sido entregue por prosperina e mergulhou num profundo sono.
Durante esse tempo, fechado no palácio de sua mãe, cupido morria de amores pela bela Psiquê, até que um dia ele conseguiu escapar por uma das janelas do palácio e, logo que encontrou a sua esposa adormecida, acordou-a com uma leve picada de suas flechas. Face a um tão grande amor, vênus não ficou insensível. Mercúrio arrebatou Psiquê à terra e transportou-a para o palácio dos Deuses onde ela bebeu o néctar e a ambrósia que lhe conferiram a imortalidade.
Assim, para sempre, ela pôde ficar unida ao amor.
O sentido do conto é bem claro. Psiquê é símbolo da alma humana purificada pelas paixões e infelicidades e preparada a gozar, no amor, uma felicidade eterna. Esse mito¹ relembra aos humanos a importância da pessoa se sentir acolhida e amada. Isso tem tudo a ver com a Psicanálise, procurada pelas pessoas para aprender a lidar com a vida, para se sentir aceita e amada pelas demais
Lacan (1992) descreve, do mito de Psiquê em seu livro 8 – Seminário, A transferência o seguinte:

Psiquê favorecida por um extraordinário amor, o do próprio Eros, goza de uma felicidade que poderia ser perfeita se não lhe viesse a curiosidade de ver de quem se trata. Não que não fosse advertida pelo seu próprio amante de nunca procurar lançar luz sobre ele, sem que este pudesse lhe dizer que sanção resultaria disso, mas sua insistência em permanecer invisível era extrema. Entretanto, Psiquê não pode agir de outra forma senão chegar a isso, e naquele momento seus dissabores começaram. ( p. 220, 221)

Se o mito tem um sentido, e com efeito o de que Psiquê só começa a viver como Psiquê, isto é, não simplesmente como provida de um dom inicial extraordinário que a faz igual a Vênus, nem tampouco por um favor mascarado e desconhecido que lhe oferece uma felicidade infinita e insondável, mas enquanto sujeito de um pathos que é, propriamente falando, aquele da alma, no momento em que o desejo que a cumulou se esquiva e foge dela. É a partir desse momento que começam as aventuras de Psiquê.
( p. 226)